Em julgamento realizado no dia 29/04/2020, o Plenário do Supremo Tribunal Federal – STF decidiu liminarmente suspender a vigência do artigo 29 da MP 927 de 22/03/2020, o qual tem a seguinte previsão: “Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.”
Com essa decisão liminar, surgiu a dúvida se a COVID-19 diagnosticada em empregados será automaticamente tratada como doença profissional.
Inclusive, muitos veículos de informação divulgaram a notícia dando a entender que a referida decisão do STF supostamente afirmou que a covid-19 é doença ocupacional.
Lembrando que, uma vez que seja considerada como doença profissional, interfere no tipo e valor do benefício previdenciário a que o empregado tem direito em caso de afastamento por mais de 15 dias, define se o empregado tem direito à garantia de emprego pelo período de 12 meses, a contar da alta médica e retorno ao trabalho, além de outros temas atinentes à responsabilidade do empregador.
Nesse diapasão, cumpre destacar que a própria legislação previdenciária (Lei nº 8.213/1991) não considera como doença profissional “a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho” (artigo 20, § 1º, “d”).
Dessa forma, como regra, salvo melhor juízo, não há uma presunção de nexo causal entre a doença e a atividade profissional realizada.
Contudo, cabe arguir como exceção os profissionais da área da saúde que estão indiscutivelmente lidando diretamente com pacientes diagnosticados com a Covid-19, pois, para estes, deve ser aplicada a inversão do ônus da prova, cabendo, assim, ao empregador comprovar que não se trata de doença ocupacional, suscitando, por exemplo, que familiares que moram com o profissional em questão foram diagnosticados com a doença antes do mesmo e, por conseguinte, o profissional da saúde provavelmente adquiriu a doença na sua residência. Esse seria um exemplo de dúvida razoável que, ao meu ver, impediria de ser considerada como ocupacional a Covid-19 adquirida pelo profissional da saúde.
Já para os demais profissionais, uma vez que o empregador demonstre que aplicou as medidas de saúde e segurança do trabalho como, por exemplo, orientando e fornecendo máscaras e disponibilizando produtos à higienização, considerando a dificuldade de identificar a origem do contágio, não há como presumir que a contaminação ocorreu no ambiente do trabalho.
Insta destacar que os empregadores devem documentar todas as medidas de saúde e segurança do trabalho adotadas, bem como o fornecimento dos EPIs (equipamentos de proteção individual) e EPC (equipamentos de proteção coletiva), como provas capazes de elidir o nexo causal entre a doença e a atividade profissional desempenhada.
Destarte, com a máxima vênia às interpretações contrárias, me parece que a decisão liminar do STF em análise deve ser avaliada com cautela, pois a mesma tem o intuito apenas de flexibilizar o entendimento, no sentido de viabilizar que os trabalhadores pleiteiem o direito, mas não significa presunção absoluta.
Isto posto, via de regra, não há como estabelecer uma presunção de doença profissional em caso de empregados diagnosticados com COVID-19, cabendo a inversão do ônus da prova somente aos profissionais da área da saúde que estejam, indubitavelmente, em contato com pacientes diagnosticados com a Covid-19.